sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Para aproveitar o silêncio

        O que você buscava em primeiro lugar quando pensou no roteiro da sua última viagem? Atrações turísticas, boas compras, surpresas para o paladar, belas praias, aconchego no frio? Quase todas as alternativas anteriores?
        E, quando se imaginou naquele lugar, havia muito movimento? Muitas pessoas fotografando algum ponto turístico, gente aglomerada em busca de bons produtos e preços, familiares e amigos reunidos à mesa, disputados lugares ao sol, taças de vinho tilintando com fondue à beira da lareira?
        E se, contrariando as expectativas usuais — as dos turistas que procuram se juntar aos demais —, você estivesse procurando silêncio, aonde você iria?
        Há pouco tempo descobri um lugar cujo silêncio às vezes me parece fruto de um sonho: Rodalquilar, que fica no Parque Natural de Cabo de Gata, ao sul da Espanha.
        Assim como na Espanha a siesta é uma instituição, por aqui o silêncio é levado à última instância — interrompido às vezes pelo barulho de um carro ou pela voz de alguém conversando (como se espera de uma cidade pacata, porém não fantasma) — e, na maior parte do tempo, quebrado apenas pelo barulho do vento, uma constante aqui. Se não fosse o vento, daria para escutar um alfinete caindo — só que na casa do vizinho.
        Uma mudança assim de ares é um ótimo exercício de reflexão sobre nosso ritmo de vida habitual, sobre quanto tempo permanecemos imersos em um barulho que nós mesmos buscamos — o rádio, a TV, o computador — e sobre o quão recompensador pode ser passear na direção contrária que a vida frenética nos impõe, atravessando as mais profundas camadas do silêncio.

















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segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Para transformar, bazar é o que há

         Bazar. Qual a primeira imagem que essa palavra suscita? Um evento beneficente no fim de semana? Um vizinho prestes a se mudar desengavetando os mais improváveis objetos e os vendendo a preços inacreditáveis para deixar boa parte da antiga vida para trás? Aquela amiga elegante que sofreu um ataque repentino de culpa por ser tão consumista e resolveu se desfazer de peças de roupa j-u-r-a-n-d-o que agora ia reduzir seu abarrotado closet a quatro portas de armário? Um artista promovendo suas criações naquele clima gostoso de café com bate-papo de tardinha?
        Bem, conceitualmente, um bazar pode ser tudo isso ao mesmo tempo agora. Se as vendas beneficiarem uma comunidade, servirem para uma mudança positiva de hábitos, ajudarem na conscientização sobre o impacto ambiental que têm as atitudes de cada um e divulgarem o talento e a criatividade de uma pessoa ou de um grupo, então esse bazar pode ser um poderosíssimo instrumento de transformação.
        Vou ilustrar tudo isso com uma experiência pessoal. Há pouco tempo me propus a fazer um bazar com os produtos da Asta, e confesso que a satisfação pessoal foi bem além das minhas expectativas. Vi velhos amigos descobrindo que um retalho não faz verão, mas vários retalhos unidos por mãos hábeis em peças criativas fazem diferença na decoração. Acompanhei olhinhos curiosos para saber de que material um produto era feito e como o artesão fazia aquilo. Percebi que algumas pessoas estavam pagando por um produto pela satisfação de adquirir o que ele representa. E ouvi muito "Quando vai ser o próximo"?
        Enfim, essa experiência foi uma bela prova de que bazares podem ser como pirilampos em noite de lua nova. Como diriam na terra do Tio Sam, I strongly recommend.



Como conselheira Asta, a divulgação de produtos feitos à mão com materiais recicláveis por artesãos de comunidades que, por sua vez, vêm sentindo na pele (ou melhor, no bolso) uma real melhoria na qualidade de vida com o escoamento de sua produção fez com que eu me sentisse um feliz elo dessa cadeia de propagação de transformação.



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segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Agradecimentos

        Esse post é o meu agradecimento a alguns blogueiros. Há anos já faz parte da minha rotina a leitura desses blogs e, hoje, em vez de apenas ler, resolvi também escrever sobre/para quem tanto me acrescentou conhecimento, emoção e diversão.
        Vou começar pelo mestre dos mestres da blogolândia: Alexandre Inagaki. Devo a ele minha incursão no mundo dos blogs.
        Um dia caiu em minhas mãos uma revista Época sobre blogs apontando o Pensar Enlouquece como um dos blogs mais relevantes do Brasil. E, assim, nasceu mais uma leitora. Tempos depois, deixei um comentário no blog e perguntei que conselho ele daria para alguém que queria começar a escrever um blog. Ele disse "Leia blogs todos os dias". Assim fiz. Eu tinha planos de criar um blog sobre decoração.
        No blogroll de Inagaki conheci a Oficina de Estilo. Estava cursando Design de Interiores e percebi que moda e decoração muitas vezes bebiam da mesma fonte. Com a intenção de descobrir o quanto moda e decoração tinham em comum, fui pesquisar na moda tendências de cores, texturas e combinações. Hoje acompanho muitos outros blogs de moda graças à Fê e à Cris.
        Certo dia, na lista de comentários de um post da Oficina de Estilo, li um comentário de Cris Guerra e logo fui parar no Hoje Vou Assim. Na época, tive o prazer de acompanhar a Oficina de Estilo e o Hoje Vou Assim sendo eleitos os melhores blogs de moda.
        Logo descobri o blog para Francisco e passei horas chorando enquanto lia os comoventes relatos de Cris. Li o blog inteiro em uma noite. E, naquela madrugada, também bati meu recorde de consumo de lenços de papel.
        Já passaram um monte de livros Para Francisco pela minha casa. Até hoje não tenho o livro. Comprei uns quatro, mas dei todos de presente. Além de considerá-lo um excelente presente, eu achava egoísmo da minha parte trancafiar aquele precioso pedaço de papel na minha gaveta; afinal, eu já o levava impresso dentro de mim!
        Também foi o blogroll do Inagaki que me levou ao Papo de Homem. Lendo um comentário de Gustavo Gitti por lá, cheguei ao Não Dois, Não Um - um blog lúcido sobre relacionamentos às vezes insanos (com o perdão da adaptação, Gustavo). Um espaço libertador. Só lendo para entender, pois o Não Dois, Não Um não se parece em nada com coisa alguma na blogolândia. Além disso, o Gustavo tem o poder de, revelando-se, fazer com que os seus leitores revelem "segredíssimos" de si. Foram os leitores mais devotados que já vi. No Não Dois, Não Um posso dizer que aprendi tanto com os posts quanto com os comentários.
        O resumo dessa jornada que começou no blog do Inagaki é que aprendi muito mais sobre o que eu não tinha ido procurar do que sobre blogs. E hoje continuo a acompanhá-los, sempre indo embora com a sensação de que aqueles textos muito me acrescentaram. Então, mais uma vez, agradeço a vocês a excelente contribuição para a minha trajetória.
        Aqui me despeço para voltar para a plateia, sentar na primeira fila, continuar aplaudindo e pedindo bis.


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sábado, 23 de julho de 2011

Uma breve definição para inteligência

        Veio de um antigo professor a melhor definição que conheço para a palavra inteligência: "Inteligência é a capacidade de estabelecer relações."


 


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sexta-feira, 22 de julho de 2011

A mulher que foi morar dentro do computador

           De repente alguém comentou sobre a mudança de comportamento da Ana. Era consenso. Um se queixou de tê-la achado meio apática. Outro dizia que ela andava meio isolada. Outros achavam que a questão era a falta de dinheiro. O fato é que ela já não procurava mais os amigos. Se não fosse por uns dois amigos que não sossegavam com a falta prolongada de notícias, ninguém saberia o que se passava com ela. Então, Marta anunciou a solução:

        — Um bazar! Vamos fazer um bazar! Assim a gente se encontra e ela ainda põe um dinheirinho no bolso. Não é ótima essa ideia?
         Ligaram para a Ana. Ela topou. Falou que deixaria a chave debaixo do tapete da porta da frente no dia do bazar para o primeiro que chegasse ir organizando tudo. Ela só conseguiria chegar mais tarde. Nomeou por telefone um encarregado. Disse que poderiam vender o que quisessem. Já fazia um tempo que ela andava enjoada de olhar para aquelas mesmas coisas.
        No dia do bazar, a casa ficou cheia. Ana tinha tanta coisa interessante, inusitada e cheia de personalidade que o boca a boca superou as expectativas. Com a demora de Ana e insistência dos amigos, mais coisas iam sendo colocadas à venda. Quatro horas depois, não restava quase nada.
        O bazar terminou, e nenhuma notícia de Ana. Os amigos, sem achá-la e cansados de esperar, resolveram comemorar o sucesso do bazar em um botequim não muito longe dali.
        No dia seguinte, Maria chegou cedinho para fazer a faxina. Antes que o dedo encostasse na campainha, notou a porta aberta. Chamou e não ouviu resposta.
        — Dona Ana? A senhora está por aí?
        — ...
        — Dona Ana?
        — ...
       &nbsp— Ué... Porta aberta, jornais velhos pelo chão. Os móveis sumiram. Então, D. Ana só pode ter se mudado!
        Maria ia pisando devagarzinho, amaciando os passos como quem teme afugentar um passarinho. Foi percorrendo os cômodos um a um. Quando passou pelo quarto, viu de relance o laptop no chão. Recuou dois passos e parou.
        — Bem, Dona Ana não ia se mudar e deixar o computador no chão, né? Logo Dona Ana, que podia viver sem sair de casa, sem telefone, sem uma alma por perto, sem TV, sem livro nem nada. Ela vivia dizendo que não precisava de mais nada disso, que tudo isso ela conseguia com o computador.
        A ideia de ver uma pessoa passando a vida diante daquela máquina dava arrepios em Maria. Ela olhou o laptop com desconfiança. Assim onde estava, encostada na porta, via o laptop de lado, com a tela abaixada, mas aberto o suficiente para perceber que saía um clarão da tela e refletia no chão. Os reflexos dançavam no chão. E havia um fone de ouvido conectado de onde parecia sair algum ruído bem baixinho. Maria, então, se aproximou para tentar escutar melhor. Mesmo assim, mais perto, os ruídos ainda eram uma massa sonora indistinta.
        De repente um reflexo pareceu pular sobre seus pés. Ela deu um pulo assustada.
        — Credo! Parece que tá vivo!
        O reflexo avançou em sua direção outra vez, parecendo querer desafiá-la. Maria empurrou a tela para cima e encarou o reflexo. Soltou um grito. O reflexo era Dona Ana batendo na tela - pelo lado de dentro.


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quinta-feira, 21 de julho de 2011

Pensamento, esse eterno selvagem

        É incrível como a humanidade se dedica incansavelmente a categorizar: vertebrados, invertebrados; analógico, digital; números ordinais e cardinais, e assim por diante. E novas classificações vão surgindo para dar conta das invenções. É preciso decompor, esmiuçar, entender, teorizar. Mas, apesar do computador, celular, inseminação artificial, clonagem, ida à lua, um ente ainda se mantém arredio ante a necessidade humana de controle: o pensamento, esse eterno selvagem.


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Pra começar

        Todo mundo quer saber como um blog começou. Bem, esse aqui começou com o simples impulso de compartilhar uma indignação. Explico: acabei de ver na TV uma reportagem sobre moradores de rua e, de repente, enxerguei algo sob uma nova ótica. Quando desliguei a TV, notei o cobertor sobre mim. E, pela primeira vez, não vi um cobertor, vi um luxo.
        Depois de assistir a todas aquelas pessoas cobertas por pedaços de papelão, meu cobertor me pareceu assustadoramente limpo, cheiroso e macio. Diante do frio que só quem dorme ao relento deve conhecer, um cobertor era, certamente, uma das necessidades mais prementes daquelas pessoas. E, diante da atual epidemia de recém-nascidos abandonados na rua, para essas pobres crianças rejeitadas, um cobertor pode fazer a diferença entre morrer ou sobreviver até que alguém as encontre.


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